Um Dia Eu Sinto Sua Falta Nidia
"Essa Certeza Só Ocorre Uma Vez na Vida"
Nidia está agora ouvindo a canção que sintetiza todas as emoções de uma mulher: Yo te Extrañaré.
Sua língua-mãe é espanhola, e em tradução literal significa “Vou sentir sua falta / Eu vou sentir sua falta...”
A música fala de partida, do verdadeiro amor que se foi.
De alguém que lamenta a morte que pode ocorrer em um segundo e acabar com um grande amor.
Mas, Nidia não chora.
Ela foi treinada para não demonstrar seus sentimentos.
Oficial militar da polícia nacional de um determinado país, aposentou-se bem jovem, aos 40.
Ela não verte uma lágrima, mas ressente-se da falta de um amor que não viveu.
A partida poderia ser a do primeiro marido, que lhe deixou três filhos homens.
Mas, ela não era feliz nesse casamento.
Teve que se superar para continuar a criar o ‘hijo’, agora já rapaz, e o mais jovem com 6 anos de idade é fruto de seu segundo casamento.
O primeiro marido se foi para sempre e ela ainda é muito bonita, apesar de ignorar o impacto que sua beleza produz diante dos olhos ávidos do sexo oposto.
Além de bonita e vaidosa, sem exageros, nem sequer na maquiagem, veste-se com muito esmero.
Independente financeiramente, e refletindo muita jovialidade aos 41 anos de idade, mãe extremosa e responsável, atrai novo pretendente ao casamento.
Sente que precisa acabar de criar seus filhos, uma missão que poderia ser bem compartilhada, e ainda ficaria bem vista diante da sociedade local.
Mira-se no exemplo de seu pai já falecido, que idolatra e decide desfrutar de sua herança moral.
Quer que seus filhos sintam o mesmo orgulho.
Esse seria um bom motivo para ter filhos criados tanto moral quanto física e mentalmente sadios.
Mas, infelizmente, ninguém convive em uma casa respirando bem e com saúde se a poeira está sendo jogada a toda hora para debaixo do tapete.
Se tivesse pelo menos acertado nessa nova escolha, garantiria para os filhos dias mais alegres, mais saudáveis, cheios de paz.
O que fosse rompido, o que fosse quebrado, o que fosse rasgado teria uma só cola, um só adesivo, um único velcro, todos nomes variáveis do amor.
Não é o que ocorre e Nidia sabe disso.
Tanto que no dia do casamento se desespera e sua fortaleza se derrete em lágrimas.
Vai para a igreja chorando.
Casa-se chorando, fez mais uma escolha errada, e vai ter que conviver com isso.
Nossa vida é toda feita de escolhas, uma decisão errada leva à dor.
E se tudo vira dor, vira sofrimento.
Se é só no corpo, um analgésico pode arrefecer, na alma dói diferente e não sara, só o amor pode curar uma alma trêfega.
O novo marido é iletrado, inculto, simplista.
Resolve tudo do alto de sua ignorância.
Ela se arrepende, mas já é tarde.
Não falam a mesma língua.
Por isso, na maioria das vezes, em vez de tentar explicar, cala-se, vivendo num monólogo infernal, onde só um fala e acha que é possuidor da verdade.
Ela refugia-se no seu ‘ordenador’ de mão, um laptop que a acompanha onde quer que vá, e que o atual marido nem sabe mexer.
Ela sempre soube que ali pode manter contato com o mundo à sua volta.
Até que em um chat descobre alguém que conjuga dos mesmos sentimentos, que fala a mesma língua que ela, que lhe oferece amor.
Ela entende essa linguagem, já que não é ávida por sexo, é vou sentir falta sim, mas de amor, como sentimento único e verdadeiro.
Sem se aperceber, vê naquilo um refrigério para tanta desilusão e se entrega inteira. Passa a manter conversas com um desconhecido que se torna íntimo.
Enquanto que o segundo marido acha que computador, na maioria das vezes, é uma perda de tempo.
Um negócio de gente que não tem mais o que fazer.
No fundo, ele vive em um submundo onde Nidia jamais foi convidada a entrar.
Onde entende que para vencer na vida, tem que suar a camisa.
E outras pérolas como: que tem que comer muito para ser saudável, que estudo nem sempre é bom, que amigo é o dinheiro, e outras coisas mais desestimulantes.
A princípio, um sentimento de culpa no cartório deixa a mulher atônita.
Seria aquilo uma traição?
Ter uma conversa tão esclarecedora com um homem estranho.
E falar coisas para esse homem que nem com o primeiro, e jamais com o segundo marido foi sequer capaz de sussurrar?
O que estaria acontecendo?
Seria amor?
Seria paixão?
E a certeza de ser valorizada e a esperança de ver a vida mudar para melhor?
Tudo, tentador demais.
Um dia, em um dia desses em que é preciso dar uma escapada do convívio familiar para colocar a mente em ordem, Nidia vai a um cinema, apenas por ir.
Mas, jamais esperava que o filme transmitisse uma lição.
Olhou o título e não se sentiu motivada, mas no elenco estavam dois ídolos de sua adolescência.
A atriz era a gloriosa Meryl Streep e o ator Clint Eastwood, vê o título e se posta como observadora daquela história que tinha uma trilha sonora envolvente.
Quando as luzes se reacendem, Nidia está maravilhada.
As Pontes de Madison - esse era o título, falava da inspiração que faltava em sua vida.
A única diferença era que Francesca foi sempre uma dona de casa.
Mas, também não era feliz em seu casamento e teve que se sacrificar pelos filhos.
Só que, ao contrário dos seus, eles pareciam nem ligar para a mãe.
Mas, Nidia podia dizer que seus filhos a amavam muito, principalmente o pequenino.
Francesca também encontra a oportunidade de sua vida ao conhecer o fotógrafo da National Geographic, Robert Kincaid.
Era só entrar naquele carro.
A felicidade, com certeza, a esperaria de portas abertas em outro lugar.
Mas, a exemplo do que Nidia jamais faria, Francesca também não o fez.
Só que o homem que mexe com o coração de Nidia a está esperando em um lugar distante.
Não é ele quem parte, e sim quem a espera, na esfuziante Miami, EUA, e seu maior receio é se poderá haver alguma decepção nesse encontro.
Ele continua a ser – como se diz por aí – o seu número certo, a outra metade da laranja, o par perfeito.
Ela comenta que viu o filme e ele diz com acerto:
‘"Esta certeza sólo ocurre una vez en la vida"
A frase com tanto significado está gravada no anel que ele promete colocar em seu dedo anelar para homenagear o encontro de suas vidas.
Nidia – Yo Te Extrañaré – Sinto sua falta.
Sim, ela sente falta de um verdadeiro amor.
De um amor que completa, melhor, que complementa.
Se incomoda a você falar de amor, é que você ainda não o viveu e com toda a certeza vai sentir falta.
Mesmo com o sem noção do segundo marido a continuar a ser grosseiro, ela precisa se manter de pé.
O que faz com a mesma desenvoltura, de pé, ereta, a mesma atitude de quando prestava continência.
Mas, apesar de seu rosto irradiar muita beleza, seus olhos se perdem no vazio.
Não há vida neles, só um brilho fugidio de esperança.
Basta uma viagem e tudo pode ficar mais perto, mais junto e para sempre.
Mas, Nidia tem medo.
Ela aciona o aplicativo e escreve em bom espanhol, cuja tradução aproximada é:
Olá meu amor você coíbe meus sentimentos reprimidos e quero apenas dizer que eu te amo e sinto sua falta.
Eu também tenho medo que a minha ilusão acabe com minha chegada porque eu não estou tentando e tentando...
Você sabe meu querido amor que não acreditava no amor e hoje estou apaixonada por você.
Mas uma coisa é certa e é como eu digo aqui abaixo:
Quando você se afastar de mim não há poder humano que venha a iludir-me, pois eu jamais aceitarei uma conversa com qualquer pessoa no interior das redes sociais.
Creio que sempre me mantive assim, numa clausura hermética, porque não creio em nada e nem em ninguém.
Tenho vivido para mim e se não me separei até hoje é porque não vou ganhar e nem perder nada.
Tu me dizes que espera que eu tenha um bom dia, mas só com meus filhos que são minha família, pois não existe nada pior que falsos amigos e você sabe que não tenho amigos.
Eu não te conheço e sempre terei medo de você aqui para que resulte em um encontro frente a frente.
Então, o vazio que sentimos até certo ponto é verdade.
Ainda que não acredite, meu amor, não há dia em que isso não ocorra com o meu marido e não discuta com ele e ele me entedia.
E eu vou te dizer porque você é meu amigo também, agora está calmo porque já discutimos, mas nós discutimos mais cedo lá em minha casa.
Você sabe meu querido amor que tenho um temperamento forte e quando alguém me machucar novamente dificilmente será o mesmo.
E que é um impedimento para qualquer homem para me fazer feliz e não acredito nessas coisas.
Prometo a você que o dia que esse amor se desviar ou acabar, nunca, nunca falar com ninguém.
Então, você é o último homem da minha existência, eu prometo não morrer ou sofrer em sua honra.
Espero que goste deste detalhe mas eu estou cansada de tudo, exceto da minha vida e dos meus pequenos.’
Nídia, Yo te Extrañaré.
Ela ama seus filhos e se deixá-los eles ficarão sozinhos.
Fará a escolha de Sofia, seguindo para Miami com o menor e deixando os outros?
Ou levará os três?
Mas, como explicar para os filhos que jamais amou o segundo marido, e jamais poderá confessar que não amava o pai deles?
Até que ponto ela poderá viver toda a essência da frase que está gravada no anel, que talvez nunca poderá ostentar no dedo anular?
‘Essa certeza só ocorre uma vez na vida”.
Ela, finalmente, encontra o amor de verdade, do tipo que todos vivem procurando, mas daí a viver esse amor há muito em jogo.
Mas, nada a impede de tentar pelo menos viver 5 dias em sua companhia. Essa foi a proposta inicial.
Lembra que no filme, Francesca vive 4.
E pelo jeito parecem ser os melhores dias de sua existência.
E se seus 5 dias forem mágicos, do tipo inesquecíveis e com gosto de quero mais e mais e mais?
Decisão difícil, principalmente porque, nessa fase seus filhos ficariam com o grosseiro e bronco segundo marido, inclusive seu menor.
Ela lembra que é mãe.
E seu pequeno vem aninhar-se em seu colo.
Ela sorri e o abraça.
O pequeno faz um movimento e liga o som.
A música volta a tocar, enchendo a casa.
Casa que ela graciosamente equipou com tudo do melhor, para que seus filhos fossem felizes.
Sempre tentando limpar a poeira do tapete a cada discussão.
A música é linda, Nidia presta atenção na letra e seu filho parece contribuir para que ela ouça sem interrupção, fica quieto em seu colo.
O cantor, como em um poema, vai recitando:
“ Eu vou sentir sua falta/ Você pode ter certeza/ Foram tantos belos e maus momentos que tivemos juntos/
Os detalhes/ As pequenas coisas/O que parecia sem importância/É que mais invade minha mente, ao te recordar/ Só o que havia dentro/
Eu gostaria de poder voltar no tempo/ Para ver-te novamente/ Para te dar um abraço e nunca te soltar...
Ela abraça o filho e pensa em jamais se soltar dele.
Sua vida continuará a ser igual.
Miami é longe, talvez, quem sabe, um dia.
Seu filho sorri gostoso com o abraço que ela lhe dá.
Ela esquece de tudo, ergue-se – mantendo-se ereta como sempre.
Como se fosse bater continência.
Mas, na verdade, abraça o filho e começa a dançar com ele, embalados pela canção. O filho sorri ainda mais.
Ela se sente feliz.
Nidia, Yo Te Extrañaré, sinto sua falta.
A esse pensamento, ela abraça ainda mais o filho.
Ele sentiria sua falta.
Esse sim é amor de verdade.
Não existe amor maior.